Não sei bem o que me levou a lá entrar. Sei que foi o primeiro dia da minha vida em Braga. Sei que saí da Universidade em Gualtar e vim a pé até ao centro da cidade. Sei que me senti cansado e sedento e entrei num centro comercial com um aspecto esquisito. Lá no fundo encontrei um café onde me sentei e comi uma tosta para enganar a falta do almoço e bebi duas colas.
O café chamava-se Enigma e ainda hoje é um enigma para mim a razão pela qual o escolhi para descansar. Passada uma semana começaram as aulas e daí a começar a fazer amizades entre os colegas de Braga foi um instante. Um dia combinámos uma saída à noite e alguém, sinceramente não me recordo quem, escolheu o Enigma como ponto de encontro. Rapidamente o café se tornou a sede não oficial das nossas saídas nocturnas e daí a tornar-se a sede oficial do nosso curso foi uma rapidez incrível.
Os anos passaram e o Enigma manteve-se. Amigos sempre presentes afastaram-se, amigos novos criaram-se e em menos de nada o nosso grupo da universidade estava misturado com o grupo dos estudantes da Escola Secundária D Maria II.
Durante esse tempo o Enigma foi a minha segunda casa. Era lá para onde ia quando saía das aulas, era lá onde ficava quando acabava de jantar. Por lá passaram algumas das pessoas mais importantes da minha vida. O Miguel a Sandra e a minha sempre querida Sónia. Lá conheci o Rui, o Victor, Marcos, Pedro, Sousa, Judite e Filipa. Naquelas mesas tive inúmeras conversas com o Filipe e o Toni, naquelas poltronas tive discussões futebolísticas intermináveis com o Paulo e o Pinho. Lembro-me da alegria contagiante da Lili, da melancolia do Henrique e daquele monumento à Amizade que é a Cláudia, já para não falar da minha fiel companheira das conversas sobre poesia, literatura, música e qualquer forma de arte, especialmente da arte das relações humanas que foi a Cecília.
Servidos pela patroa, a D. Alice e pelas inesquecíveis empregadas Carmo e Lurdes, a juventude sorveu-se por um copo de fino e a vida devorou-se ao sabor de tostas e cachorros. Foram tantas as tardes de estudo naquelas mesas, sentado nas cadeiras mais desconfortáveis que conheci na vida, nem todas rentáveis porque as estudantes de enfermagem também tinham a mania de lá ir, e, acreditem, eram bastante mais atraentes que os apontamentos de Bioquímica, Paleontologia ou Geologia de Portugal. Lá comecei dois namoros e terminei um deles. Foram tantos os beijos roubados, inúmeros os olhares trocados, incontáveis os sonhos partilhados.
Foi no Enigma que festejei os 20 anos do PS, que soube e lamentei a morte do Ayrton Senna, que celebrei o campeonato de 93/94 do Benfica e que questionei como fôra possível aquele monumento ao futebol que foi o 4-4 com o Bayern de Leverkussen. Passei lá 4 aniversários meus e inúmeros aniversários de amigos, vivi lá o melhor e o pior que a vida tem para oferecer a jovens estudantes universitários em estágio para uma vida adulta que desejam como ar para os pulmões e lamentam amargamente depois de a ter.
Nem sei como explicar a felicidade que lá vivi nem a tristeza de a ter deixado.
Hoje, 15 anos depois, entro neste café e tudo mudou. Mudou o dono, mudou o arranjo do espaço, desapareceu o grupo que lhe deu vida no meu tempo de estudante, mas a recordação fica. Essa é minha e ninguém ma poderá algum dia tirar. O Enigma é hoje uma café moderno, bem desenhado e estruturado, quase como uma obra de arte, muito diferente do desenho artesanal antigo. Eu hoje sou um Homem diferente. Os meus sonhos de juventude e de estudante esbarraram na realidade da vida e muitos deles não recuperaram. Mas mais importante do que fazer essa análise, são as duas ou três lágrimas que derramei quando de lá saí. Foi como se estivesse numa máquina do tempo e tivesse tido a sorte de, por momentos, ter revivido muito daquilo que me fez e do qual já não me recordava. Por uma breve meia hora reencontrei todos os meus amigos e amigas, alguns deles ainda comigo, outros uma breve recordação no sótão da minha memória.
Hoje vou para casa um pouco melancólico, mas feliz como há muito não me sentia.
O Enigma ainda vive, e enquanto viver, a parte mais bonita da minha vida não morrerá !
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Olá meu Querido!
Genial poder recordar com tanta precisão os muito bons momentos partilhados...
Com carinho
Tua Sónia
Unknown disse...
1/9/07 20:43