Há noites assim. Felizmente ainda há, muito esporadicamente, jogos e jogadores que nos fazem lembrar que o futebol pode ser mais que um simples desporto. Não vou aqui fazer uma análise ao jogo com a Naval, isso já muitos bem melhores do que eu o fizeram numa dezena de jornais e numa centena de blogs. O que me interessa no que se passou na Luz está relacionado com um jogador, o tal de quem treinadores, adeptos e, até, um palerma cheio de dinheiro, disseram estar acabado e ser apenas uma espécie de amuleto sem utilidade prática para o plantel.
O seu nome é Rui Manuel César Costa e, confesso, não me lembro dele antes do penalti que decidiu a vitória de Portugal no mundial de 1991. Nessa altura não ligava muito ao futebol por isso não sei quando se estreou pelo Benfica, quem o lançou, nem muito menos se mereceu ir rodar para o Fafe ou se tal foi uma profunda injustiça. Lembro-me da sua cavalgada furiosa em direcção às bancadas da Luz para festejar com os adeptos a conquista do trono mais elevado do mundo para o seu escalão etário. Lembro-me dessa sua força imparável, dessa sua garra que parecia vir do fundo da sua alma, que parecia ser a sua alma. Rui Costa tornou-se rapidamente no símbolo de um Benfica em constantes convulsões internas, e quando do polémico verão quente e da debandada de alguns jogadores, questionado sobre a hipótese de, também ele sair a custo zero, a sua resposta foi clara : " NUNCA ".
Rui Costa saiu, naquele que foi o melhor negócio de sempre até então para o Benfica. Emigrou mas parte de si nunca saiu do 3º anel, e nunca se escusou de afirmar que um dia voltaria. Espalhou a sua classe por campos e campeonatos, ganhou títulos, mereceu elogios e conquistou adeptos. Pelo caminho voltou à Luz e marcou-nos um golo, um dos golos mais emblemáticos da sua vida pois mostrou ao mundo que apesar de se esforçar pela vitória do seu "patrão" não deixava de sofrer pelo seu clube de sempre.
Rui Costa voltou, como sempre prometeu fazer, dando um exemplo raro de um jogador que não se assume como profissional da bola, mas apenas como um Benfiquista que joga bem futebol e, como tal, só poderia acabar a sua carreira na única verdadeira casa que teve na vida. O seu regresso foi saudado por muitos e criticado por tantos. Diziam que vinha ganhar a reforma, que precisava de muletas e cadeiras de rodas e que o Benfica jogaria com menos um jogador em campo. O resultado está à vista. Sábado de noite, tal como desde o início deste ano, jogou e fez jogar. Defendeu e atacou, passou e cruzou, rematou, assistiu e marcou um daqueles golos que desafiam a lei do esquecimento. Mais lindo ainda que isso, brincou, falou com o público, saltou aplaudiu e fez com que nunca nos esquecêssemos que é um de nós. O seu sorriso ao fazer uma vénia às bancadas é uma estátua, um monumento à simplicidade e alegria de um Homem que com uma bola nos pés continua a ser um miúdo.
Rui Costa nunca se afirmou como uma estrela, preferindo sempre dar valor à constelação de que faz parte. Rui Costa marcará o imaginário de uma geração que viu o futebol tornar-se num negócio e os jogadores em funcionários pagos principescamente para trocar de camisolas ao sabor das comissões dos seus empresários, como um dos últimos moicanos do tempo em que uma camisola era um contrato para a vida.
Voa Rui, dentro e um dia fora dos relvados, voa nas asas dessa tua águia de sempre. Voa para a eternidade e deixa-nos essa maré enorme de recordações de um miúdo com asas nos pés, a baliza entre os olhos e o emblema do Benfica tatuado no coração, que um dia nos conquistou a todos.
Se o futebol fosse um Deus, tu Rui serias o seu último profeta.
Abençoado sejas e obrigado por tudo.
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