Requiem

Passados cerca de 5 anos do seu início, eis que chega o fim. Não vou armar-me em versão actualizada de LaPalisse e dizer uma parvoíce do género de “tudo o que tem um início tem um fim”, por várias razões, sendo a principal das quais a de não acreditar nisso, há para mim coisas que não acabam, mas voltarei a isso mais tarde. O que me interessa neste momento de despedida é mesmo fazer um balanço dos últimos 5 anos, estes que passei na vossa companhia, apesar da minha indisciplinada escrita.

O despistagens nasceu em Aljezur por influência de um colega e Amigo que já habitava a blogosfera. Nasceu para não ser nada de concretamente definido, como escreveu António Gedeão, nasceu para ser um espaço de partilha e, acima de tudo, uma válvula de escape porque sou daqueles que têm grande facilidade em desabafar com um papel. Quem acompanhou desde sempre sabe isto que estou a escrever, nunca houve um rumo claro na condução deste blog. Não foi sobre política nem sobre educação, não foi sobre desporto nem sobre cultura, não foi sobre nada, antes sobre tudo, e ainda acima desse tudo, foi sobre mim e sobre os “meus”. Os “meus”! Não me podia despedir sem dar mais uma prova da minha lendária arrogância. Quem são estes “meus” ? Quem são estas pessoas que mesmo na hora da despedida me reservo ao direito de as tratar com um pronome possessivo?

São colegas e companheiros, são alunos e amigos, são paixões e amores. São as pessoas com quem tive a sorte de me cruzar, são criaturas que assinaram a fogo os seus nomes no meu cansado e por vezes martirizado coração, são almas, sonhos e vontades que por existirem ajudaram a fazer de mim quem sou. São pessoas que não pedi para conhecer mas supliquei para não se irem embora, são homens, mulheres, adolescentes e crianças que sem saber, e provavelmente sem querer, deram combustível para continuar esta maravilhosa aventura, que fizeram com que viver não fosse só estar para aqui a gastar oxigénio e produzir dióxido de carbono.

É por isso, é por eles(as) que escrevi acima que não concordo que tudo tenha um fim. Este carrossel imaginário que se move sem motor aparente, este puzzle infindável sem imagem para guiar a que chamamos de vida não tem fim. Não é possível falar num ponto final quando nos movemos numa teia de relações, não devemos acreditar que a nossa passagem pela vida dos outros, ou que as suas passagens pela nossa, se esgota num momento, nem que esse momento seja a tão falada morte. A nossa vida não acaba com o nosso último suspiro, as vidas dos nossos não se esvaem ao seu último olhar. Transportamos connosco as experiências que tivemos com os outros mesmo depois do seu desaparecimento físico, os outros terão consigo os momentos que lhes proporcionámos, as coisas que lhes ensinámos, os sentimentos que partilhámos e até os sonhos que não cumprimos. Assim será o despistagens, espero. Uma assinatura minha, é verdade, mas também vossa.

Nestes 5 anos troquei Aljezur por Olhão, uma sala de aula por um gabinete na DREALG, uma casinha na praia de Monte Clérigo por um apartamento em Olhão, uma junta de freguesia por uma assembleia municipal. Passei por uma paixão, uma aventura, um amor e algo de muito forte que ainda não consegui descrever nem a mim próprio. Tive altos e baixos, dei a segunda maior queda de sempre em Junho do ano passado e levantei-me com uma força que não conhecia desde os tempos da Universidade. A partir de Setembro último entrei numa fase tão positiva e tão segura que nem os últimos dois meses ameaçaram. Nestes 5 anos vivi momentos extraordinários e outros que nunca vou saber como aguentei, mas continuo. Continuarei sempre. Sei-o porque sei que com todos os meus defeitos sou das pessoas que marcam a vida dos outros, sei-o porque não tenho dúvidas que apesar das minhas contradições como ser humano, a minha atitude para com as pessoas de quem gosto consegue marcar diferença, mesmo quando não o reconhecem na hora, mesmo quando tentam escondê-lo ou desvalorizá-lo. Continuo exponencialmente optimista, raramente deixo de encontrar a saída airosa para uma situação complicada. Ainda não perdi, nem a capacidade de amar, nem a capacidade de fazer outras(os) sentirem-se amadas(os), não desisti nem desistirei de encontrar uma simples mortal a quem possa levar o resto da vida a fazê-la sentir-se como uma Deusa.

No fundo é isto. Parece complicado mas é de uma simplicidade aterradora. No fundo o que quero escrever nesta despedida é que faço questão que as pessoas que me ensinaram a sonhar saibam que ainda não desisti de o fazer. Quero ainda dizer-vos que são capazes. Não sei de quê, mas são. Vocês são capazes de tudo. Eu e vocês, todos nós temos em nós próprios as forças necessárias para vencer as adversidades, mas também temos em nós os medos e as indefinições que nos fazem perder e nos fazem sofrer. Podemos acusar a vida, podemo-nos queixar de azares ou de atitudes de outros mas em última análise somos os últimos e únicos responsáveis pelas decisões que tomamos. Quando nos sujeitamos ao que nos faz mal, é de forma voluntária que o fazemos, quando encontramos segurança numa situação conhecida que nos magoa em vez de arriscarmos o mundo novo que o desconhecido oferece, estamos a trocar a expectativa de uma viagem pela certeza de uma fateixa. Quando paramos para fazer o balanço, temos uma e única questão para responder: “Sou feliz”?

Terminando este testamento, é apenas isso que vos quero deixar. São felizes? Se são, parabéns, eu um dia também serei. Se não são, por amor da santa, façam-se. Façam-se felizes, confiem em quem vos quer fazer felizes, sem contudo prometer mundos e fundos, esforcem-se para que as pessoas que se cruzam convosco vão para casa mais felizes do que estavam antes de se terem cruzado convosco. Não se amarrem com medo do desconhecido, não se furtem a viver o que a vida vos oferece, perdoem os pequenos erros que todos cometemos mas desconfiem de quem vos magoa deliberadamente e depois vos afoga com lágrimas de crocodilo.

É tudo muito fácil, acreditem. Eu não sou nada de especial e muitas vezes consigo, vocês também podem conseguir. Obrigado pela vossa companhia e pela vossa presença. Até sempre.

Façam-me um favor, sejam felizes.

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